terça-feira, 13 de maio de 2008

Pitões

"Quando se fala de Trás-os-Montes ou é pelas misérias, ou pelos analfabetos ou então pelas ruas com burros a cair de podres. Mas há tanta coisa bonita para mostrar...". O desabafo é de Maria Júlia Pereira, habitante de Vassal, Valpaços. Só quem visita a região pode regalar a vista com paisagens de cortar a respiração e património antiquíssimo, saborear gastronomia única e conhecer as suas gentes. Homens e mulheres de "antes quebrar que torcer", que trazem espelhada no rosto - queimado no Inverno pelo frio e no Verão pelo sol - uma vida de trabalho árduo.Os habitantes do Barroso são assim. Vivem uma realidade que aos poucos parece dar ares de outra graça devido ao turismo. Que o diga José Gonçalves, proprietário da Casa da Fecha, na aldeia de Cambezes do Rio, Montalegre. Tipicamente barrosã, coberta por colmo (palha de centeio), algum com mais de 40 anos, a casa é a residência de vacas, porcos, galinhas e também de Maria Conceição Lourenço, de 67 anos de idade, que lembra: "Vêm aqui muitos estrangeiros. Há dias, estiveram cá uns a filmar. Quem é que os entendia?".Filmaram a Casa da Fecha, a aldeia e quem nela habita. E talvez aquele senhor que nos impediu de o fotografar com as suas vacas, por estar descontente com a actuação do Governo na sua terra. Por isso, diz, "lá, em Lisboa, não têm nada que nos ver". Não fosse a melhor disposição da senhora que o acompanhava e lá se ia o retrato. "Tire lá a fotografia, mas depois quero uma para mim!" avisou.E é gente como esta que nunca vai ao talho, por ter a casa farta de presuntos e fumeiro, prontos a servir quando a cara do visitante lhe agrada. Fumeiro que também vendem. Pessoas que, na Primavera, largam o gado no monte e o recolhem no início do Inverno rigoroso. Porque é lá que hão-de sustentar-se à base do que a natureza dá, para gáudio dos que comerão a sua carne, sobretudo nos restaurantes da região que encimam os seus menus com a vitela barrosã. Não admira que António Fernandes, habitante de Pitões das Júnias, diga à boca cheia que "não há, no mundo, vitela tão boa como a do Barroso". E essa vitela pode ser comida não só nalguns dos restaurantes da região, e os há de fama em Montalegre, como a "Casa do Preto". Ali, recomenda-se, entre outros pratos, o cozido à portuguesa barrosão (sem frango). Ali, um casal pode dormir por apenas 25 euros diários, sem direito a pequeno almoço.A dois passos de Espanha e com as montahas do Gerês ao lado, dando moldura granítica a uma paisagem monumental, é sempre a não perder a caminhada em direcção à cascata do rio Campesinho e ao Mosteiro de Santa Maria das Júnias, que, apesar de votado ao abandono, é digno de se ver.Depois, se o regresso não for de descanso para o olhar, deve-se desfrutar as belezas das serras da Cabreira e do Gerês, pousando a vista nos lençóis de água das albufeiras do Alto Cávado e Alto Rabagão.Na zona de Boticas, impõe-se uma visita ao Castro do Lezenho, onde, no século XVIII, foram encontradas quatro estátuas de guerreiros Calaicos, um dos ex-libris do concelho. Também vale a pena perguntar se, embora já sejam poucos os agricultores a produzi-lo, ainda alguém lhe dá a provar o "vinho dos Mortos", assim chamado por ser engarrafado após um ou dois anos de maturação debaixo de terra.

Sem comentários: